traços de répteis incandescentes pelas dunas, hastes quebradas, excrementos geométricos sinalizando com rigor apertados caminhos
areias de cor indecisa
são bons estes lugares de cinza, para a solidão insuspeita dos pássaros
da boca das areias desmoroando-se irrompem
fosforosos bichos, adocicados corpos, um rosto de fogo encima o leite vagaroso das nuvens
depois, ouvem-se os nomes dos barcos
e do vento uma voz explode, fende, desfaz a tempestade
teu corpo acalma por cima do misterioso espelho
mão na mão, percorremos todas as águas
conhecemos os domínios húmidos dos monstros marinhos
e a loucura dos peixes cegos, que deu nome ao nosso amor e às cidades costeiras
outras feridas alastram subitamente no fulcro da memória
outras noites atravessam-se
semeiam pelo corpo flores e pânico
falo com os barcos postos-a-seco, das salivas marinhas cresce uma quilha enfurecida
a escrita é um marulhar incessante
imito a paisagem como se te imitasse, ou se te escrevesse
teu corpo dilui-se nos ossos da página, contamina as cartilagens das sílabas
resta-me o fingimento sibilante das palavras
caminho pelo interior das dunas, aago o rasto de tinta acetinada, sou terra num texto onde não encontro água
só noite e um rumor imperceptível no coração
mais nada